Tomás de Aquino: Questões Discutidas Sobre a Verdade Pergunta Oito Todas as verdades derivam da Verdade Primeira?

 




Introdução

       As primeiras 7 perguntas são as seguintes:

       1- Que é a verdade?

       2- A verdade encontra-se primariamente na inteligência ou nas coisas?

       3- A verdade reside somente no intelecto sintetizante e analisante?

       4- Haverá uma só verdade, em virtude da qual todas as coisas são verdadeiras?

       5- Haverá alguma outra verdade eterna, além da verdade primeira?

       6- A verdade criada será imutável?

       7- A verdade se predica, em Deus, da essência ou das pessoas?

       As respostas são as seguintes resumidamente:

       Primeira: De fato tudo que é verdadeiro é o próprio ser, ou seja, a verdade e o ser absoluto são correspondentes.

       Segunda: A verdade encontra-se primariamente na inteligência à medida que está relacionada à inteligência divina, caso não esteja na inteligência divina a verdade deixa de ser o que é.

       Terceira: A verdade reside em duas faculdades do intelecto humano: discernimento (intelecto sintetizante e analisante) e no intelecto formulador de definições (intelecto quidistante).

       Quarta:  A verdade única é a verdade divina, que é a Verdade Primeira, porque está acima das demais verdades porque é incriada.

       Quinta: Só existe uma Verdade Primeira, já que só ela contempla a eternidade e também seu conhecimento diz respeito a tudo.

       Sexta: A verdade criada sempre será mutável, porque não é como a Verdade Primeira, já que a criada está sujeita aos fatores de tempo e demais que a tornam finita, diferente da Verdade Primeira que é eterna e imutável.

       Sétima: a Verdade nunca é um princípio criador, mas um princípio derivado (se predica) da essência de Deus.

       Portanto, prosseguimos seguindo o comentário da argumentação da pergunta de hoje que é esta: Todas as verdades derivam da Verdade Primeira?

       O ESQUEMA ESCOLÁSTICO SEMPRE SEGUE A IDEIA DE:

       1- TESE

       2- CONTRATESE

       3- RESPOSTA  A  QUESTÃO ENUNCIADA

       4- RESPOSTA  AOS  ARGUMENTOS DA TESE.

         Convido também que quando lerem as questões da Suma Teológica do mesmo autor o esquema é 1- Apresentação; 2- Solução; 3- Respostas às objeções.

       Tudo isso se chama dialética: que é o discurso que submete crenças ao processo da prova, mediante ensaios e tentativas de traspassá-las por objeções. (CARVALHO, 2013, p. 30)

TESE: NÃO PARECERIA QUE TODAS AS VERDADES DERIVAM DA VERDADE PRIMEIRA.

       É verdadeiro que este homem comete fornicação. Ora, isto não procede da Verdade Primeira. Logo, nem toda verdade deriva da Verdade Primeira. (1)

       Ao argumento acima pode-se objetar, porém, que a verdade do sinal ou da inteligência, em virtude da qual isto se denomina verdadeiro, procede de Deus, não porém a verdade em virtude da qual se refere à coisa.

       A isto se responde: além da Verdade Primeira não existe apenas a verdade do sinal ou do intelecto, mas também a verdade da coisa. Portanto, se a verdade acima (este homem comete fornicação) não procede de Deus no que se refere à coisa, esta verdade da coisa não derivará de Deus, e assim segue a mesma conclusão, isto é, que nem todas as verdades derivam de Deus. (2)

       O que se destaca nestas afirmações são as seguintes distinções: 1- Verdade Primeira: a própria essência de Deus manifestando o ser da verdade; 2- Verdade do Sinal ou Intelecto: seria a capacidade de julgamento entre certo e errado; 3- Verdade da coisa: que seria o relacionamento sintático entre o homem (sujeito) e o ato de fornicação (predicado).

       Portanto, sendo Deus perfeito ele não pode ser o autor do ato de fornicação, ou seja, a verdade da coisa está sem conexão com a Verdade Primeira, pois o caráter de Deus reprova a fornicação.

       Assim, nem todas as verdades derivam da Verdade Primeira.

CONTRATESE: PARECERIA QUE TODAS AS VERDADES PROCEDEM DA VERDADE PRIMEIRA.

       1. A propósito da passagem da Primeira Epístola de São Paulo aos Coríntios, capítulo XII, versículo 3 ("Ninguém, falando sob ação divina, pode dizer: 'Jesus seja maldito', e ninguém pode dizer: 'Jesus é o Senhor', senão sob a ação do Espírito Santo"), afirma Ambrósio: "Tudo o que é verdadeiro, por quem quer que seja dito. procede do Espírito Santo". (1)

       Além disso, toda bondade criada procede da Primeira Bondade Incriada, que é Deus.

       Logo, pela mesma razão toda verdade procede da Verdade Primeira, que é Deus. (2)

       3. Além disso, o conceito de verdade se efetiva na inteligência. Ora, toda inteligência deriva de Deus. Logo, toda verdade deriva de Deus.(3)

       Estas afirmações da Contratese exaltam a perfeição criadora de Deus. Já que para louvar a Deus é preciso a própria ajuda de Deus, quando diz, que procede do Espírito Santo ( a terceira pessoa da Trindade) o louvor a segunda pessoa (Filho – Jesus Cristo).

       E assim como a bondade é própria de Deus, portanto, sendo a verdade em todas as suas formas tem como origem Deus, que é a Verdade Primeira (principalmente Deus em Cristo).

 

RESPOSTA A QUESTÃO ENUNCIADA.

       Conforme acima expusemos, nas coisas criadas a verdade se encontra tanto nas próprias coisas como na inteligência. Nesta última, enquanto concorda com as coisas que chega a conhecer; nas coisas, enquanto concordam com a inteligência divina, a qual constitui a medida das mesmas, assim como a arte criadora humana é a medida de todas as suas produções. De certo modo a verdade reside também nas coisas criadas, enquanto têm aptidão para produzir uma compreensão verdadeira no intelecto humano, o qual tem nas coisas a sua medida comensurante.

       Nesse ponto cabe aqui entender que a Verdade só reside no intelecto humano enquanto ela pode produzir uma compreensão verdadeira no pensamento humano, dessa forma, também o pensamento humano só compreende devido às experiências da verdade das coisas.

       Dizendo na linguagem de hoje as capacidades cognitivas do ser humano só possuem relação com a verdade na medida em que ela ( a Verdade) pode produzir conhecimento verdadeiro.

       Como resultado temos o seguinte: a verdade que se encontra nas coisas criadas não pode compreender em si outra coisa senão o ser da respectiva coisa, e a sua conformidade com o conhecimento, bem como a conformidade do conhecimento com as coisas ou as privações das coisas. Tudo isto provém de Deus, uma vez que de Deus deriva também a forma das coisas, através da qual subsiste a mencionada conformidade concordância, como de Deus provém outrossim a própria verdade, como o bem ou o valor que é próprio da inteligência, segundo se lê no livro VI da Ética [de Aristóteles], isto é, que o valor de cada coisa consiste no seu agir perfeito. (...) Assim, é na verdade que consiste o valor da inteligência. Ora, já que todo o bem e toda forma procedem de Deus, deve-se afirmar sem reservas que toda verdade tem a sua origem em Deus.

       Tomás de Aquino faz uma citação de Aristóteles para provar que o agir perfeito de Aristóteles que está ligado a perfeição do movimento, ou seja, o imóvel gerar movimento no móvel, o que serve como argumento de Tomás de Aquino para existência de Deus, que seria uma causa que não tem causa gerar todas as coisas.

       Com relação a verdade, Aquino, diz que a Verdade das coisas, de qualquer forma tem sua origem em Deus (a Verdade Primeira) já que Deus dá forma a todas as coisas.

RESPOSTA  AOS  ARGUMENTOS DA TESE.

       Ao argumentar-se assim — Tudo o que é verdadeiro procede de Deus; ora, é verdadeiro que este homem comete fornicação — ocorre uma falácia, conforme se deduz do que acabamos de expor. Com efeito, ao dizermos que a fornicação é verdadeira, não afirmamos isto no sentido de que a imoralidade presente no ato da fornicação estaria incluída no conceito da verdade. O verdadeiro, no caso, designa apenas a conformidade deste ato com a inteligência. Por conseguinte, a conclusão que segue do argumento não é "A fornicação deste homem procede de Deus", mas "A verdade deste ato procede de Deus". (1)

       Conforme se evidencia da nossa exposição precedente, a imoralidade e outras deficiências não encerram a verdade do mesmo modo que as outras coisas. Por isso, embora a verdade das deficiências proceda de Deus, disto não se infere que as deficiências em si mesmas derivem de Deus. (2)

       Segundo o Filósofo no livro VI da Metafísica a verdade não consiste na composição ou combinação que reside nas coisas, mas na combinação operada pela inteligência. (3)

       Sintetizando esta resposta Tomás de Aquino ao usar o exemplo do Homem em ato de fornicação como verdade. Diz enfim que toda a verdade em si é procedente de Deus. A frase: Este homem está em fornicação como verdade é procedente de Deus, contudo a imoralidade (deficiência) que é o ato de fornicação não tem procedência em Deus.

       Assim o escolástico diz que a verdade do ato de fornicação é uma constatação da inteligência humana, e a inteligência humana é procedente de Deus.

       Conclusão: Todas as verdades são procedentes da Verdade Primeira, porque são a conformidade entre o fato e a inteligência. Pois a Verdade Primeira é fonte de toda a atividade da inteligência humana. Mas a Verdade Primeira não é origem da imoralidade. Já que Deus é prefeito e puro sem nenhum indício de imoralidade.

       Terminamos assim: E assim, embora muitas sejam as essências ou as formas das coisas, uma só é a verdade do intelecto divino, em virtude da qual se denominam verdadeiras. (Suma Teológica Questão XVI Artigo VI)

IMPLICAÇÕES

       A VERDADE PRIMEIRA  APESAR DE SER ORIGEM DE TODA A VERDADE ELA NÃO SE CONFUNDE COM ATOS IMORAIS DA HUMANIDADE.

       TUDO QUE É BOM É DERIVADO DO PERFEITO, LOGO ESTE PERFEITO TRANSCENDE NOSSA INTELIGÊNCIA, VOLTE-SE AO CRIADOR.

       NOSSA INTELIGÊNCIA É PRIVILEGIADA, USE-A PARA CONSTRUIR COISAS QUE AJUDEM O PRÓXIMO, POIS AO AJUDAR O PRÓXIMO EXPERIMENTAMOS A PERFEIÇÃO DE DEUS, E QUANDO EXPERIMENTAMOS ISSO CUMPRIMOS A MISSÃO DE SERMOS VERDADEIRAMENTE FELIZES.

       AMATE VERITATEM IN OMNI TEMPUS ET PACEM OMNIBUS PERSEQUATE.

       •Amai vós a verdade em todo o tempo, e segui vós a paz com todos.

REFERÊNCIAS

       STO. TOMÁS E DANTE Vida e Obra, São Paulo: Nova Cultural, 1988.

       —BATISTA, William Memória da Ausência – os séculos de elaboração do discurso sobre o mistério, Rio de Janeiro: Letra Capital, 2011.

       —GEISLER, Norman & Paul D. Feinberg Introdução a Filosofia, uma perspectiva cristã, Tradução: Gordon Chown, São Paulo Vida Nova, 1983.

       —GILSON, Étienne Por que São Tomás Criticou Santo Agostinho?/ Avicena e o Ponto de Partida de Duns Scotus, tradução: Tiago José Risi Leme. São Paulo: Paulus, 2010.

       CARVALHO, Aristóteles em Nova Perspectiva, 2013, Vide Editorial.

 



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Oração na vida dos reformadores 1

12 princípios do evangelismo segundo David Bosch parte 1

Os Puritanos nas colônias inglesas da América do Norte no século XVII