Tomás de Aquino: Questões Discutidas sobre a Verdade - Haverá uma só verdade, em virtude da qual todas as coisas são verdadeiras? (Quarta Pergunta)
Introdução:
Retomando
o comentário anterior, estas questões de Tomás de Aquino são um total de 12.
Foi
trabalhado anteriormente com as seguintes perguntas:
1-
Que é a verdade?
2- A
verdade encontra-se primariamente na inteligência ou nas coisas?
3- A
verdade reside somente no intelecto sintetizante e analisante?
Retoma-se
de maneira supersintética estas respostas:
1ª-
De fato tudo que é verdadeiro é o próprio ser, ou seja, a verdade e o ser
absoluto são correspondentes.
2ª-
A verdade encontra-se primariamente na inteligência à medida que está
relacionada à inteligência divina, caso não esteja na inteligência divina a
verdade deixa de ser o que é.
3ª-
A verdade reside em duas faculdades do intelecto humano: discernimento
(intelecto sintetizante e analisante) e no intelecto formulador de definições
(intelecto quidistante).
É
importante relembrar que a linguagem escolástica tem algumas características
próprias:
*Foi
formulada num ambiente de profissionais eclesiásticos (clérigos, monges,
padres) que fundaram as primeiras universidades europeias (Bolonha, Oxford,
Paris). Tomás era de Paris.
*Como
cristãos ele se viam como tradutores da sabedoria antiga dos gregos romanos
como elementos de apoio à verdade cristã.
*Portanto,
viam-se como autênticos continuadores do apogeu da filosofia grega de Platão e
Aristóteles.
*Também
pode ser constatado que era uma linguagem altamente técnica que não se repetiu
com os modernos, a escolástica era reservada aos clérigos e seus discípulos
diretos.
Método dos Escoláticos
Encerrando
esta introdução o método de Aquino seria precursor da dialética de Hegel,
quando segue este esquema:
TESE
---à CONTRATESE --à RESPOSTA
Haverá uma só verdade, em virtude da qual todas as coisas
são verdadeiras?
TESE:
PARECERIA QUE HÁ UMA só VERDADE DA QUAL DERIVAM TODAS AS OUTRAS
Destaca-se
aqui “que assim como tempo está para tudo que é temporal [passageiro] da mesma
forma a verdade está para todas as coisas verdadeiras.” Ele cita o mais antigo
escolástico Anselmo de Cantuária.
CONTRATESE:
PARECERIA HAVER UMA MULTIPLICIDADE DE VERDADES.
“Ora,
a coisas semelhantes múltiplas correspondem semelhanças múltiplas. Logo, a
coisas verdadeiras múltiplas correspondem verdades múltiplas.”
"Deve-se
crer que a natureza da inteligência humana está de tal modo relacionada com as
coisas inteligíveis, que enxerga tudo o que conhece sob certa luz sui
generis". Ora, a luz sob a qual o intelecto humano tudo vê é a verdade.
Logo, a verdade pertence ao gênero da própria inteligência, e portanto é
necessário que cada coisa criada constitua uma verdade. Consequentemente, a
cada coisa criada corresponde uma verdade. – Citando Agostinho.
Neste
aspecto Aquino sempre usa a palavra analogia com o sentido de comparação para
se compreender que assim como uma luz pode gerar múltiplas cores, a verdade
incriada da qual derivam todas as coisas pode gerar múltiplas verdades.
Contudo, ao citar Agostinho no final da contratese o escolástico diz que a
inteligência por estar vinculada a verdade, cada coisa (ser) constitui uma
verdade a parte.
RESPOSTA
A QUESTÃO ENUNCIADA:
“Conforme
se evidencia do que precede, a verdade reside, em sentido próprio, na
inteligência divina ou na humana, assim como a sanidade se encontra no ser
vivente.”
Aquino
diz que a verdade se manifesta de maneira hierárquica: a verdade divina está
ligada a inteligência divina que é única; que vai gerar a verdade humana que
vem em segundo lugar, e a verdade das coisas é derivada das primeiras e será
sempre múltipla.
RESPOSTA
AOS ARGUMENTOS DA TESE:
“A
verdade que permanece, ao perecerem as coisas, é a verdade existente na
inteligência divina. Esta verdade é numericamente uma só. Ao contrário, a
verdade que reside nas coisas ou na inteligência humana varia conforme variam
as coisas. “
“A verdade
sob cuja luz a inteligência humana tudo julga é a Verdade Primeira”- a Verdade
Primeira é a verdade divina.
“Deve-se
dizer que mesmo a verdade criada nada encerra que se assemelhe ao falso, embora
toda coisa criada carregue em seu bojo algo que se assemelha à falsidade. (...)
Contudo, a verdade reside na coisa criada, não enquanto esta encerra
deficiências, mas enquanto se liberta das mesmas e está em conformidade com a
Verdade Primeira.”
RESPOSTA
AOS ARGUMENTOS DA CONTRATESE:
“No
sentido próprio, a semelhança reside em cada uma das duas coisas comparadas. Ao
contrário, a verdade, por constituir uma concordância entre a inteligência e a
coisa, não reside, no sentido próprio, em ambas (na inteligência e na coisa),
mas só no intelecto.”
“Embora
a luz inteligível tenha o seu exemplar ou modelo na luz divina, todavia o termo
luz se predica em sentido próprio também das luzes inteligíveis criadas”
“Ainda
que a verdade divina não constitua modelo ou exemplar de modo igual para todas
as coisas criadas, nem por isso se exclui que todas as coisas sejam verdadeiras
em virtude de uma única verdade, e isto em sentido próprio.”
“Embora
as coisas de espécie diferente não apresentem a mesma conformidade com a
inteligência divina, esta é uma só, e é com ela que concordam todas as coisas
denominadas verdadeiras.”
“Ora,
conforme as explanações que demos acima, tais verdades, existentes nas nossas
inteligências e derivantes da Verdade Primeira, são múltiplas.”
Conclusão
da Pergunta:
*A
verdade divina que é única está hierarquicamente acima das demais verdades,
pois é incriada.
As
demais verdades, chamadas verdades das coisas são múltiplas porque foram
criadas e são deficientes por não possuírem as qualidades de eternidade e
perfeição. Já os seres que são espirituais tanto anjos quanto seres humanos
apesar de possuírem verdades múltiplas sua fonte é a Verdade Primeira que é
única.
IMPLICAÇÕES
AMATE
VERITATEM IN OMNI TEMPUS ET PACEM OMNIBUS PERSEQUATE.
•Amai
vós a verdade em todo o tempo, e segui vós a paz com todos.
BIBLIOGRAFIA
STO.
TOMÁS E DANTE Vida e Obra, São Paulo: Nova Cultural, 1988.
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São Paulo:Edições vida Nova, 2012
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Luciano & Roque Frangiotti Metafísica: Antiga e Medieval, São
Paulo: Paulus, 2012.
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